Simoni e Elifrank são soropositivos para o HIV. Ela do centro-oeste e ele do nordeste do país, eles se conheceram durante o II Encontro da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS (RNP+ Brasil), realizado em agosto de 2007 na cidade de Manaus. Alguns meses depois ele deixou a capital amazonense Manaus rumo a Cuiabá, onde ela vivia e estão juntos desde então.
Elifrank e Simoni decidiram celebrar esta união durante o III Encontro da RNP+ Brasil, realizado de 18 a 21 de agosto de 2009 em Campina Grande, na Paraíba, ao lado de seus pares – no caso, outras 250 pessoas vivendo com HIV/AIDS (PVHA). Na cerimônia simbólica, o secretário nacional da rede “abençoou” o casal. E um integrante do Distrito Federal leu algumas passagens bíblicas. Teve beijo e bolo de verdade e bênção de mentirinha. Os noivos tiveram padrinhos e madrinhas de todas as regiões do Brasil.
Apesar do incômodo, percebi a ação afirmativa no ato cerimonial. Um homem e uma mulher soropositivos que se entregam novamente ao impulso, ao desejo, à paixão e ao amor; juntam seus caminhos e seguem unidos pela vida, porque acreditam nela. É verdade que aumentou a expectativa de vida depois de mais de 25 anos, beirando a terceira década da epidemia de AIDS no mundo e por isso fazemos planos para o futuro.
Eu mesmo, 21 anos depois de diagnosticado positivo para o HIV, e há 17 anos fazendo uso de medicamentos antirretrovirais, passei em terceiro lugar num mestrado e estou mudando de cidade para fazer o curso. Aumentou a expectativa de vida porque aumentou nossa qualidade de vida. Simoni e Elifrank celebraram a vida.
Embora a cerimônia do casal tenha sido a primeira notícia recente, um dia antes do início do evento, o III Encontro Nacional da RNP+ Brasil, que teve por tema a frase “Celebrando a Rede, Revendo as Conquistas e Reinventando o Ativismo”, foi melhor que o segundo e que o primeiro encontro juntos em qualidade de discussões, debates, proposições, capacitação e resolução. A principal delas foi a mudança de metodologia. Ao invés de centenas de propostas para o legislativo, executivo e judiciário, apenas um documento político, intitulado Carta de Campina Grande, com reflexões voltadas mais para o processo interno da RNP+ Brasil do que para os contextos e as conjunturas externas, ainda que também as contenha.
Aprovada no mérito, a Carta de Campina Grande será construída a partir das relatorias e dos vídeos gravados dos quatro (“rumos”, “seguridade social, políticas públicas e controle social”, “direitos humanos” e “relações e políticas internacionais”) eixos (mesas expositivas seguidas de debate e grupos de discussão e trabalho), e das oficinas (“vacinas anti-HIV”, “casas de apoio” e “co-infecção tuberculose + HIV”) capacitadoras. O documento trará uma firme oposição da RNP+ Brasil à criminalização pela transmissão do HIV, a necessidade de revisão da legislação que regulamenta as casas de apoio às pessoas doentes de AIDS e a dificuldade de acesso à elaboração, implementação e fiscalização das metas e dos recursos financeiros dos Planos de Ações e Metas (PAM) de alguns estados e municípios diametralmente oposta à credibilidade que a RNP+ Brasil tem em outros estados, municípios e no âmbito federal.
Internamente, a carta apontará a dificuldade de comunicação interna e vai levantar a necessidade de capacitações à distância e por meio dos grupos de trabalho (GT) criados: GT Criminalização, GT Política de Drogas, GT Trans+ e GT de Seguridade Social. Também vai pincelar questões sobre direitos e deveres das PVHA, cuja carta de direitos fundamentais das pessoas vivendo com HIV/AIDS faz 20 anos, além de outros pontos não menos importantes.
Finalmente, elegemos nossas representações nacionais na Comissão Nacional de DST e AIDS (CNAIDS), para a Comissão de Articulação com os Movimentos Sociais (CAMS) e Comitê de Vacinas, instâncias do Departamento de DST/AIDS do Ministério da Saúde; definimos representantes para o Grupo Temático ampliado do UNAIDS no Brasil (GT UNAIDS) e para a REDLA+ (Rede Latino-americana de PVHA) e fizemos nossa indicação para o representante do movimento brasileiro de luta contra a AIDS no Conselho Nacional de Saúde, a ser referendado em novembro, em encontro de ONG/Aids de todo Brasil no Rio de Janeiro.
Além das questões políticas, é bom encontrar nossos pares, conhecidos, amigos e pessoas a quem nutrimos grande carinho. É bom rever pessoas como a gente, que apesar de viver com HIV, continuam sendo parte da solução e não o problema da epidemia de AIDS no mundo. Até 2011, em São Paulo. E viva a vida!
Publicado originalmente no site gay.com.br
2 comentários:
Olá amigo Paulo
É maravilhoso celebrar a vida, e a vossa solidariedade aí entre pares é invejável. Quem me dera que por cá, entre nós seropositivos, houvesse tão boa vontade...
E você sempre na primeira linha da luta.
Parabéns pelo seu mestrado.
e
tem um prémio lá no Tempo de Janela, se quiser pegar passe lá.
Um beijo enorme
deste lado de cá
Querida Maria,
Obrigado pelo prêmio, pelo seu carinho e seu afeto. Saiba que eles são recíprocos.
Viva a Vida!!!
Postar um comentário