quinta-feira, 26 de julho de 2012

Brazil: do the homework!


Ativistas brasileiros: the dream is over!
“Brasil, faça a lição de casa!” Foi com esta frase que ativistas brasileiros deixaram a manifestação na frente do estande oficial do Brasil, em AIDS 2012 e se dirigiram à sala de imprensa. Foi a primeira manifestação do movimento social que invadiu o “media center”. Atrás de nós vieram os redutores de danos e uma ONG indiana, que protestava contra o acordo de medicamentos que a Índia está fechando com a União Europeia e que vai dificultar a produção de medicamentos genéricos no país.

Mas, voltando ao Brasil, todas as pessoas do movimento social brasileiro presentes à conferência internacional de AIDS, em Washington, D.C., estavam na manifestação. Eu, que fiquei responsável apenas por fazer algumas fotos não resisti e, como meus companheiros de ativismo, amarramos nossas bocas com uma fita vermelha com a palavra “danger” (perigo) e interrompemos a apresentação de samba empunhando cartazes com frases que denunciaram a situação da epidemia de AIDS no país, cerca de 10h30 em DC (11h30 em Brasília).

A fita foi a estratégia que usamos para não nos confundirmos com o inglês, além de denunciar a censura que temos sofrido e os critérios estritamente políticos de aprovação de alguns projetos da sociedade civil. E Jorge Beloqui e Alessandra Nilo tomaram o microfone e deram nosso recado, enquanto um de nós usava a mesma fita para isolar o estande brasileiro. O recado: o governo tem sufocado o movimento social, dificultando o controle social. O melhor programa de AIDS do mundo morreu e está matando a sociedade civil brasileira. O governo da presidente Dilma tem sistematicamente se dobrado aos evangélicos, censurando a campanha de carnaval e o kit anti-homofobia. ONG estão fechando as portas etc., etc., etc.

Hoje, o governo dos Estados Unidos fará uma doação de US$ 2 milhões a um novo fundo, criado para ações de combate à AIDS. Há dois dias, integrantes do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde têm questionado os ativistas presentes em Washington perguntando se são mais bem-vindos os US$ 2 milhões de Hillary Clinton ou os R$ 7 milhões lançados em editais. Perguntaram a mim e a dois outros ativistas. Pensam que não sabemos fazer contas. Dos R$ 7 milhões (que representam cerca de US$ 3,5 milhões), parte é para o edital de fóruns e redes recém-lançado, cujo montante deve ser utilizado em dois anos. Qual é a diferença?

Além disso, os EUA têm uma cultura de doações de pessoas físicas e jurídicas. Na Marcha sobre Washington, há dois dias, quando chegamos aos jardins da Casa Branca, logo chegaram pacotes e mais pacotes de garrafas de água. Também foi passada uma bandeira de Washington, onde as pessoas punham dinheiro. Faça-se isso no Brasil e veja o quanto se recolhe.

A algumas pessoas, o Departamento de AIDS tem dito que o trabalho das ONG deveria ser voluntário. Mais? Quem sobrevive com R$ 1.500 de coordenação de um projeto para ser executado por dois anos com uma carga de 40 horas semanais? Sem recolhimento de INSS, FGTS, IRPF: ou seria melhor chamar isso de semiescravidão? Brasil, mostra sua cara, diga-nos quem paga pra assassinar paulatinamente o melhor programa de AIDS do mundo. Brasil, mostra sua cara, faça a lição de casa para voltar a ser o melhor programa de AIDS do mundo, com a participação e cooperação da sociedade civil.

Participo de AIDS 2012 por indicação da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS (RNP+ Brasil) para compor a delegação oficial brasileira, com recursos do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Hillary dá a deixa e ativistas marcham sobre DC


Hillary fala à AIDS 2012 (Ryan Rayburn/IAS)
Certamente por motivos de segurança, Hillary Clinton não foi anunciada. Mas foi ovacionada quando chegou à plenária desta segunda-feira da AIDS 2012. Diante dos aplausos, a secretária de Estado norte-americano disse, brincando, que não seria possível uma haver uma conferência internacional de AIDS sem manifestações da sociedade civil.

A brincadeira de Hillary parece ter sido a deixa para as diversas manifestações realizadas a partir do meio-dia desta terça-feira, por toda a cidade, que literalmente pararam a capital dos EUA. As cinco manifestações encontraram-se em frente aos jardins da Casa Branca e basicamente pediam mais recursos financeiros para a luta contra a epidemia. Não apenas para as pesquisas básicas, mas para a sociedade civil.

Mas, voltando à aplaudidíssima secretária de Estado, Hillary disse que estava naquela sessão para anunciar uma meta. “Mas antes disso deixem-me dizer cinco palavras que por muito tempo não fomos capazes de dizer: bem-vindos aos Estados Unidos da América. Estamos satisfeitos em finalmente tê-los aqui conosco novamente”, disse, referindo-se às restrições à entrada de pessoas soropositivas nos EUA, retiradas em 2010.

A secretária de Estado não falou apenas à audiência da primeira sessão plenária da AIDS 2012, mas, principalmente, aos ativistas norte-americanos que vêm criticando o governo de Barack Obama por não ter incluído no orçamento de 2013 recursos para o PEPFAR (o programa do presidente para o combate à AIDS). “PEPFAR está mudando emergencialmente para que possamos construir sistemas de saúde sustentáveis, que irão nos ajudar a finalmente ganhar essa luta para ter uma geração sem AIDS. Quando o presidente Obama tomou posse, nós sabíamos que se quiséssemos vencer a luta contra a AIDS não podíamos continuar a tratá-la como uma emergência. Tivemos que mudar fundamentalmente a maneira, como nossos parceiros globais fizeram.”

Apesar de não ter citado as populações mais vulneráveis à infecção pelo HIV, como homens que fazem sexo com homens, negros, latinos e transexuais, Hillary falou principalmente das mulheres, pois seu propósito ali era anunciar um adicional de US$ 80 milhões para a prevenção vertical do HIV. “Estamos empenhados em erradicar a transmissão do HIV da mãe para a criança até 2015. Já investimos mais de US$ 1 bilhão para esta meta ao longo dos anos. Acessamos mais de 370 mil mulheres no mundo no primeiro semestre deste ano fiscal e esperamos acessar mais 1,5 milhões de mulheres até o próximo ano”, anunciou a secretária de Estado, acrescentando “toda mulher deve ser capaz de decidir quando e se quer ter filhos. Isto é verdade se ela é HIV-positiva ou não. E eu concordo com a forte mensagem da Cúpula de Londres sobre Planejamento Familiar no início deste mês. Não deve haver controvérsia sobre isso. Nenhuma”. O discurso em inglês de Hillary, na íntegra, pode ser acessado na página da secretaria de Estado norte-americano, bem como o vídeo de seu pronunciamento.

Hoje, parece que a marcha sobre Washington foi para lembrar, não apenas aos EUA, mas aos governantes de todo o mundo, que apesar da falta de recursos a sociedade civil ainda está viva. E em alerta. E pronta para cobrar-lhes as promessas.

Participo de AIDS 2012 por indicação da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS (RNP+ Brasil) para compor a delegação oficial brasileira, com recursos do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde.

domingo, 22 de julho de 2012

Sharon Stone abre XIX Conferência Internacional de AIDS em Washington, DC; Obama não aparece

A atriz Sharon Stone, em foto Steve Shapiro/IAS
Vestida com um pretinho básico, mas com um reluzente colar de brilhantes, a atriz Sharon Stone abriu há pouco a AIDS 2012. Logo em seguida, entregou o prêmio Liz Taylor a dois ex-prisioneiros do Irã, pela luta deles pelos Direitos Humanos. Um vídeo com imagens de diversos momentos lembrou o envolvimento de Taylor contra a AIDS.

Depois de 22 anos, é a primeira vez que uma conferência de AIDS volta a ser realizada nos EUA. A próxima, em 2014, será em Melbourne, na Austrália. Mas, enquanto apenas inicia-se esta 19ª conferência internacional para a qual 10 mil resumos de trabalhos científicos ou de experiências exitosas foram submetidos, 20 mil delegados de 200 países são esperados além de 800 bolsistas, mais de dois mil jornalistas e 700 voluntários para 250 sessões, cerca de 300 atividades na Aldeia Global e de 150 sessões satélite que se iniciaram no meio da semana.

Segundo comunicado do Centro de Mídia de AIDS 2012, a conferência internacional volta a solo americano em um momento definitivo para a epidemia de AIDS nos EUA. Neste mais recente comunicado os números foram refeitos para 23 mil delegados de 195 países, o que não interessa muito, mas dá pra saber a dimensão de uma conferência deste porte. O objetivo final permanece o mesmo: dar fim à epidemia de AIDS que há mais de 30 anos já ceifou milhões de vidas em todo o mundo.

“Voltamos aos EUA depois de 22 anos, num momento de grande esperança, pois acreditamos na possibilidade de acabar com a AIDS”, disse Elly Katabira, presidente internacional de AIDS 2012 e da Sociedade Internacional de AIDS (IAS, na sigla em inglês, instituição organizadora das conferências de AIDS). Exultante, Katabira acredita, ainda, que esta conferência é uma excelente oportunidade para agradecer e mostrar ao povo norte-americano os milhões de vidas salvas graças à ajuda dos EUA na luta mundial contra a AIDS e nas pesquisas sobre o HIV.

A co-presidente norte-americana da conferência, Diane Havlir afirmou que houve um grande progresso sobre a epidemia nos últimos 30 anos, mas que não é possível permanecer assim. “Minha mensagem para todos os legisladores do mundo que estão em D.C. é que invistam em ciência, invistam na epidemia – vocês vão salvar vidas”, pediu Havlir.

Ela e Katabira pediram aos delegados presentes e aliados em todo o mundo que assinem a Declaração de Washington,D.C., que convoca à renovação da urgência e busca obter amplo apoio para poder acabar com a epidemia de AIDS.

“Nos 22 anos que se passaram desde que a conferência foi realizada em solo americano tivemos alguns êxitos esperados no campo da ciência e do tratamento”, disse Kathleen Sebelius, secretária norte-americana de Saúde e Serviços Humanos. “Mas este não é o momento de mudar o foco. Para alcançar nosso objetivo, que é chegar a uma geração sem AIDS, devemos fazer mais – para alcançar inclusive a mais pessoas, para que os programas sejam mais efetivos e responsáveis, para avançar ainda mais no campo da ciência.”

“Há um progresso sustentável na resposta à AIDS que acelera nosso caminho para chegar a zero transmissões por HIV”, afirmou Michel Sidibé, diretor executivo do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS). “A luta contra a AIDS tem mostrado o caminho para mudar o rumo. Temos a responsabilidade de assegurar que as lições apreendidas no campo da AIDS informem e melhorem nossos esforços para alcançar outros objetivos, sobretudo a erradicação da pobreza”, disse Jim Yong Kim, presidente do Banco Mundial.

Falaram, ainda, durante a abertura de AIDS 2012, Vincent Gray, prefeito de Washington, D.C., o secretário geral da ONU Ban Ki-moon (por mensagem e vídeo), a congressista norte-americana Barbara Lee, e o embaixador do Zimbábue Mark Dybul. A última conferência internacional de AIDS foi realizada em 1990 em San Francisco e foi proibida de ser realizada nos EUA por causa da restrição à entrada de pessoas infectadas pelo HIV ou doentes de AIDS no país. Apenas após a derrubada desta restrição, em 2010 é que a IAS permitiu a realização de uma nova conferência em solo norte-americano.

Participo de AIDS 2012 por indicação da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS (RNP+ Brasil) para compor a delegação oficial brasileira, com recursos do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde.

No metrô de Washington


Cartazes de variados temas tentam captar a atenção das mais diversas populações foram afixados nas estações do metrô de Washington, D.C. Este é apenas um deles, que diz: Decidindo o momento: "tomando o controle e começando o tratamento". Muito legal!

Incremento da AIDS entre latinos preocupam EUA

Em algumas horas começa a AIDS 2012 – XIX Conferência Internacional de AIDS. Pelos monitores disponíveis na sala de imprensa se veem pessoas trabalhando nos últimos ajustes para a sessão plenária. No piso superior, filas de delegados se formam para seus pegarem seus materiais e, principalmente, seus crachás de identificação.

Pela manhã, participei de um evento satélite que pretende criar uma rede latina que visa a um futuro sem HIV/AIDS nos EUA. Interessante a fala de Kurt Organista, professor da escola de bem estar social da Universidade da Califórnia. Segundo ele, a prevenção do HIV está baseada em 86% aos modelos biomédicos e apenas 14% aos modelos das Ciências Sociais. Para Organista, os modelos de prevenção deveriam basear-se 50% de cada um dos modelos.

Para a porto-riquenha Miriam Vega, vice-presidente e diretora de pesquisa e avaliação da Comissão Latina sobre AIDS, criada no Bronx, em Nova York, três contextos de vulnerabilidade são fundamentais para a os crescentes índices de HIV/AIDS entre latinos nos EUA: avaliabilidade, acessibilidade e aceitabilidade, que influenciam extremamente nos determinantes estruturais: pobreza, estigma e criminalidade.

Nos EUA, a incidência e a prevalência do HIV crescem assustadoramente entre latinos e diminuindo entre brancos, segundo informou Mario Perez, diretor da Divisão de Programas sobre HIV e DST do Departamento de Saúde Pública do Condado de Los Angeles, Califórnia, e responsável por um orçamento de US$ 100 milhões anuais. Segundo ele, latinos em LA preferem ser identificados como PVHA a serem identificados como homossexuais, pois a homofobia é muito grande, levando latinos à pobreza e à marginalidade. Perez terminou sua fala com uma provocação: “quem são as vozes latinas em LA?”

Problemas decorrentes da imigração e da migração, tais como isolamento, depressão, subemprego, pobreza, falta de moradia, prisão e deportação são fundamentais para acrescer vulnerabilidade aos latinos nos EUA, segundo Thomas Painter, do Centro de Controle de Doenças (CDC), em Atlanta. Para ele, são necessários ações criativas para envolver as comunidades latinas afetadas pela epidemia.

Os EUA têm mais de um milhão de pessoas vivendo com HIV e AIDS, das quais 80% conhecem sua sorologia e apenas 33% estão em terapia antirretroviral.

Participo de AIDS 2012 por indicação da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS (RNP+ Brasil) para compor a delegação oficial brasileira, com recursos do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Deception or hope never dies

Estou arrumando as malas. Embarco à noite para Washington, D.C., onde participo da XIX International AIDS Conference – AIDS 2012. Estava bastante esperançoso com esta conferência, que não acontece nos EUA desde 1990. Minha esperança era que fosse anunciada uma nova descoberta contra a AIDS, como aconteceu em 1996 em Vancouver, no Canadá, e que o presidente Barack Obama participasse da cerimônia de abertura, dia 22. Afinal ele está em campanha eleitoral e pouco antes da Conferência de Viena, realizada em 2010, os EUA retiraram as restrições para a entrada de pessoas vivendo com HIV/AIDS no país, facilitando a realização desta em Washington.

Mas acabo de ler no The Washington Times que Obama será representado pela secretária de Estado Hillary Clinton e a secretária de Saúde e Serviços Humanos Kathleen Sebelius. O ex-presidente Bill Clinton e a ex-primeira-dama Laura Bush falarão na conferência e suas presenças foram confirmadas anteriormente, como a de Bill Gates e sir Elton John, por exemplo. A Fundação Clinton financia a aquisição de medicamentos de comunidades africanas e pesquisas de vacinas contra o HIV; no governo George W. Bush foi lançado o Plano de Emergência do Presidente para o Alívio da AIDS (PEPFAR, na sigla em inglês). Segundo o jornal, a proposta de orçamento de Obama para 2013 não contempla o PEPFAR, mas a Casa Branca reafirmou seu empenho no combate à AIDS.

O Brasil não deve ser bem recebido em Washington, avalia Pedro Chequer, coordenador do UNAIDS no Brasil, em entrevista publicada no blog do jornalista Roldão Arruda. Para Chequer, ex-diretor do extinto Programa Nacional de DST/AIDS (atualmente Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais), o país, que teve destaque em outras conferências pelo “pioneirismo das políticas públicas de prevenção ao vírus e tratamento da síndrome [...] vem perdendo a vanguarda na área de prevenção”, devido ao sucesso de grupos religiosos que têm influenciado decisões governamentais contrárias à difusão de informação correta sobre saúde pública às populações mais vulneráveis à infecção pelo HIV.

Fui indicado pela Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS (RNP+ Brasil) para compor a delegação oficial brasileira que participará da conferência, com a missão específica de informar a rede sobre minhas impressões das sessões plenárias, das apresentações de trabalhos, do que eu ver. Vou tentar fazer isso por aqui e pelo meu twitter, pois o site da RNP+ Brasil está sendo reformulado.

Ontem, o laboratório Gilead Sciences anunciou que os EUA liberaram o antirretroviral Truvada para profilaxia para reduzir o risco de infecção pelo HIV, segundo informações da Agência Reuters. Um dia antes do início de AIDS 2012, o Brasil inaugura fábrica de medicamentos antirretrovirais em Maputo, capital de Moçambique, na África. A propósito do tema da conferência – “Revertendo a Maré em Conjunto” –, a Sociedade Internacional de AIDS (IAS) e a Universidade da Califórnia (UCSF) lançaram a Declaração de Washington, D.C, para acabar com a epidemia do HIV/AIDS, e que colhe assinaturas online. Por isso, como anunciei no título, apesar da decepção com a ausência de Obama e o que ela pode significar para o combate à epidemia não apenas nos EUA, mas em todo o mundo, a esperança nunca morre.