sábado, 29 de agosto de 2009

RNP+ Brasil reinventa ativismo na Paraíba

Simoni e Elifrank são soropositivos para o HIV. Ela do centro-oeste e ele do nordeste do país, eles se conheceram durante o II Encontro da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS (RNP+ Brasil), realizado em agosto de 2007 na cidade de Manaus. Alguns meses depois ele deixou a capital amazonense Manaus rumo a Cuiabá, onde ela vivia e estão juntos desde então.

Elifrank e Simoni decidiram celebrar esta união durante o III Encontro da RNP+ Brasil, realizado de 18 a 21 de agosto de 2009 em Campina Grande, na Paraíba, ao lado de seus pares – no caso, outras 250 pessoas vivendo com HIV/AIDS (PVHA). Na cerimônia simbólica, o secretário nacional da rede “abençoou” o casal. E um integrante do Distrito Federal leu algumas passagens bíblicas. Teve beijo e bolo de verdade e bênção de mentirinha. Os noivos tiveram padrinhos e madrinhas de todas as regiões do Brasil.

Apesar do incômodo, percebi a ação afirmativa no ato cerimonial. Um homem e uma mulher soropositivos que se entregam novamente ao impulso, ao desejo, à paixão e ao amor; juntam seus caminhos e seguem unidos pela vida, porque acreditam nela. É verdade que aumentou a expectativa de vida depois de mais de 25 anos, beirando a terceira década da epidemia de AIDS no mundo e por isso fazemos planos para o futuro.

Eu mesmo, 21 anos depois de diagnosticado positivo para o HIV, e há 17 anos fazendo uso de medicamentos antirretrovirais, passei em terceiro lugar num mestrado e estou mudando de cidade para fazer o curso. Aumentou a expectativa de vida porque aumentou nossa qualidade de vida. Simoni e Elifrank celebraram a vida.

Embora a cerimônia do casal tenha sido a primeira notícia recente, um dia antes do início do evento, o III Encontro Nacional da RNP+ Brasil, que teve por tema a frase “Celebrando a Rede, Revendo as Conquistas e Reinventando o Ativismo”, foi melhor que o segundo e que o primeiro encontro juntos em qualidade de discussões, debates, proposições, capacitação e resolução. A principal delas foi a mudança de metodologia. Ao invés de centenas de propostas para o legislativo, executivo e judiciário, apenas um documento político, intitulado Carta de Campina Grande, com reflexões voltadas mais para o processo interno da RNP+ Brasil do que para os contextos e as conjunturas externas, ainda que também as contenha.

Aprovada no mérito, a Carta de Campina Grande será construída a partir das relatorias e dos vídeos gravados dos quatro (“rumos”, “seguridade social, políticas públicas e controle social”, “direitos humanos” e “relações e políticas internacionais”) eixos (mesas expositivas seguidas de debate e grupos de discussão e trabalho), e das oficinas (“vacinas anti-HIV”, “casas de apoio” e “co-infecção tuberculose + HIV”) capacitadoras. O documento trará uma firme oposição da RNP+ Brasil à criminalização pela transmissão do HIV, a necessidade de revisão da legislação que regulamenta as casas de apoio às pessoas doentes de AIDS e a dificuldade de acesso à elaboração, implementação e fiscalização das metas e dos recursos financeiros dos Planos de Ações e Metas (PAM) de alguns estados e municípios diametralmente oposta à credibilidade que a RNP+ Brasil tem em outros estados, municípios e no âmbito federal.

Internamente, a carta apontará a dificuldade de comunicação interna e vai levantar a necessidade de capacitações à distância e por meio dos grupos de trabalho (GT) criados: GT Criminalização, GT Política de Drogas, GT Trans+ e GT de Seguridade Social. Também vai pincelar questões sobre direitos e deveres das PVHA, cuja carta de direitos fundamentais das pessoas vivendo com HIV/AIDS faz 20 anos, além de outros pontos não menos importantes.

Finalmente, elegemos nossas representações nacionais na Comissão Nacional de DST e AIDS (CNAIDS), para a Comissão de Articulação com os Movimentos Sociais (CAMS) e Comitê de Vacinas, instâncias do Departamento de DST/AIDS do Ministério da Saúde; definimos representantes para o Grupo Temático ampliado do UNAIDS no Brasil (GT UNAIDS) e para a REDLA+ (Rede Latino-americana de PVHA) e fizemos nossa indicação para o representante do movimento brasileiro de luta contra a AIDS no Conselho Nacional de Saúde, a ser referendado em novembro, em encontro de ONG/Aids de todo Brasil no Rio de Janeiro.

Além das questões políticas, é bom encontrar nossos pares, conhecidos, amigos e pessoas a quem nutrimos grande carinho. É bom rever pessoas como a gente, que apesar de viver com HIV, continuam sendo parte da solução e não o problema da epidemia de AIDS no mundo. Até 2011, em São Paulo. E viva a vida!

Publicado originalmente no site gay.com.br

2 comentários:

maria vital disse...

Olá amigo Paulo

É maravilhoso celebrar a vida, e a vossa solidariedade aí entre pares é invejável. Quem me dera que por cá, entre nós seropositivos, houvesse tão boa vontade...

E você sempre na primeira linha da luta.

Parabéns pelo seu mestrado.

e

tem um prémio lá no Tempo de Janela, se quiser pegar passe lá.

Um beijo enorme

deste lado de cá

Paulo Giacomini disse...

Querida Maria,
Obrigado pelo prêmio, pelo seu carinho e seu afeto. Saiba que eles são recíprocos.
Viva a Vida!!!